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Foto do escritorvitória martins.

PEDRA ✸ PROSA POÉTICA DE VITÓRIA MARTINS.

O meu “ te amo” ficou nesse vazio. Eu fiquei ali e voltei a uma pedra muito distante. Me lembrei dela em um relance do meu reflexo, ou será que foi quando estávamos falando sobre o outono? Lembro do antigo em relances de sentimento, e acho que em algum momento me apaixonei pelo paleolítico. Toda essa mudança de se expressar e formar, me assusta. Me assusta. Fico acomodada com o passar dos séculos, e me fixo aqui. Ainda lascando um grão de areia, mas eu juro, é uma pedra. 

Meu maior medo é que se torne uma pedra, mas há um orgulho e uma incerteza, que criam histórias de dormir sobre o surgimento e aprimoramento da pedra. A história de dormir diminui todo o meu núcleo, e faz tempo que não encosto nele. 

Me dê um sinal de que me ama. Além do “eu te amo”. Além do abraço que acolhe uma menina trêmula e uma mulher com pé atrás, deixe mais escancarado o seu amor. Não sei o que pode fazer, talvez corra nas ruas gritando o meu nome e falando que sou a pessoa mais incrível do mundo, ou talvez me deixe participar da curadoria dos seus pensamentos. Me deixe julgar eles junto com você, por favor. Mas não me deixe. Não me deixe, bem na véspera desse sentimento de morte.

Me leve para a grama molhada, para que eu possa colocar os meus pés no barro. E foi assim que fizeram a gente né? Do barro vermelho e com a essência de chuva em pleno verão quente, bem nessa época boa para descer e ir em uma praia nesses litorais paulistas. Só queria sentir a sua pele molhada, assim que você acaba de dar um mergulho na água salgada. 

Essa água esverdeada e essa areia acinzentada, me faz lembrar dos momentos em que você me abraçava e minha pele se tornava uma só com a sua. Você me pegava pelo colo e me tirava desse oceano poluído, que me diluía apenas em um sentimento. Se era amor, solidão ou dependência, até hoje eu não consigo distinguir. Talvez hoje eu esteja leve até de mim, e pela manhã até a noite o vento me leva á lugares e palavras que já não fazem mais sentido. 

Lembro de inúmeras manhãs em que eu saía de casa e apenas ficava observando a rotina da minha vizinha, enquanto ela cuidava da sua quitanda. Era tão colorida e me lembrava a casa contraída nos anos 70, em que minha vó mora até hoje no Rio. Eu pensava que se um dia eu me esforçasse muito, eu conseguiria sorrir sem parar igual a minha vizinha fazia e se eu tivesse sorte, eu até conseguiria viver pela minha própria quitanda. 

Não vejo mais a minha vizinha, já faz tempo isso. Hoje eu me encontro em um pensamento na beira do mar, com um personagem que eu precisava muito que estivesse vivo.

Se isso é um adeus ou um tempo de espera até te encontrar no mercado da cidade junto com a sua nova vida, eu não sei. Mas espero aprender à me reconhecer novamente. A entender que vim ao mundo para ser uma só e apenas eu posso carregar a minha própria história, não devo mais colocar ela em suas costas. 

Não me procure no seu subconsciente e me deixe longe das suas palavras, assim será melhor. Não sei se terei a ousadia de viver ou de aprender sobre a vida, mas eu acho que isso já está acontecendo em meio a esse marasmo que estou respirando e me sufocando.


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